O dia se espatifa: Maria, a baleira

terça-feira, 4 de junho de 2013

Maria, a baleira

Maria é baleira. Desde pequena, por gostar muito de mexer com açúcar, dizia que seria baleira, apesar de muita gente insistir com ela que seria uma furada. "Baleiro no Brasil ganha muito mal!" Mas não adiantou. Ela ganhou apoio do pai – um advogado que sonhava secretamente se tornar baleiro –, fez a faculdade de balismo e, aos 21 anos, estava formada e empregada na maior fábrica de balas do estado onde morava.

Doze anos depois de formada, Maria estava satisfeita com os rumos da carreira, mas não aguentava mais ganhar tão mal. Para aumentar a renda, ela fazia trabalhos paralelos como boleira. Fazer bolos era parecido com fazer balas, mas pagava melhor – e ela podia fazer de casa. Como estava sempre reclamando dos equipamentos feitos dentro da empresa para fazer balas e era cheia de opinião, Maria foi transferida para a área que produzia esses equipamentos. Lá, ela ia funcionar como uma espécie de "meio de campo" entre as duas áreas.

Maria ralou muito, aprendeu muito, chorou muito de saudade de suas balas e seus colegas baleiros. Mas Maria gostou da mudança. Ela não mexia mais com açúcar na firma, mas compensava essa ausência trabalhando com seus bolos. Não fazia mais pelo dinheiro, porque o salário de quem fabrica equipamentos é bem melhor do que quem os utiliza para criar (o que ela achava uma injustiça), mas achava que fazer bolos era um plano B decente.

Aliás, Maria nunca se conformou com o fato de que o marido e os amigos baleiros – muitos dos quais com anos e anos de carreira – tinham salários equivalentes ao de jovens recém-formados e muito crus de sua área. Infelizmente, sabia que se tratava da lei do mercado. O que fazer se aquela era praticamente a única fábrica de balas do estado e apenas uma de muitas opções de empresas para os profissionais da sua nova área? Fazia sentido que a fábrica de balas pagasse mais para os técnicos do que para os verdadeiros produtores daquilo que fazia o sucesso da empresa: as balas.

Nessa função, Maria teve ótimos colegas e um excelente chefe, que entendia da importância das balas e dos baleiros para a empresa e trabalhava com ética e justiça. Um dia, esse chefe foi promovido, e Maria assumiu a função dele interinamente. Sempre soube que não passaria de interina. Não tinha vocação para gestão e reconhecia lhe faltar a maturidade que o cargo exigia (apaixonada, Maria tinha a péssima mania de ser transparente em suas ideias e indignações).

Depois da experiência que teve com o chefe bacana (que foi promovido para outra área), Maria tinha altas expectativas quanto ao substituto dele. Daí o grande espanto da Maria quando a diretora da área a chamou para dizer que seu novo chefe dela seria o trainee da diretora. O mesmo que até a semana anterior era descrito como "o menino que serve café".

(Continua...)

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